domingo, maio 30, 2010

Salve Sandra Bullock...



 
Não quero falar sobre coisas tristes. Mas elas andam sempre por aí, na maioria das vezes em nossa companhia. Quero escrever sobre outras coisas, quero virar a página. Mas esse mês foi difícil, foi terrivelmente difícil. Hoje é dia 29 e quero que ele vá embora de uma vez por todas, então é preciso, mesmo que arrastadamente, empurrar esses momentos ruins para o registro do passado.E , a única forma, é passando por eles, falando neles. Depois do dia 4 de maio, mais ou menos, quando já estava assimilando o triste acontecimento do meu amigo, eis que novo golpe da existência me foi dado. Descobri, sozinho, on-line, pelo Orkut, mensagens de “descanse em paz” nos recados de um outro amigo. Mais que amigo, esse também, mas que pela particularidade da diferença de 17 anos entre nós, tinha entrado na categoria de filho, afilhado, irmão mais novo. Aquele que cuidamos e nos preocupamos, pela sua felicidade, pelas suas realizações e descobertas que nos são compartilhadas. O Diego estava morando em Bento Gonçalves, trabalhando no que mais adorava e desejava: Como locutor numa rádio local. Uma voz grave, formidável. Fez 21 anos em Dezembro de 2008.Tem as fotos no Orkut. E pela distância e atribulações da vida de cada um, deixamos nosso contato virar a rotina da internet. O Diego nos deixou em abril ou maio de 2009. Nem fez 22. Deixava mensagens e não recebia retorno. Não querendo incomodar mais, fui deixando o tempo passar. Descobri um ano depois. Outro que foi embora e nem me avisou. Porque deveria? Logo eu, um “João Grilo qualquer, um amarelo muito safado”. Nem deuses, nem espíritos, nem coisa nenhuma foi capaz de me dar um sinal. O Diego era espírita. Era evangelizador, dava aulinhas pras crianças sobre a doutrina. Falávamos bastante sobre isso. Eu no meu ceticismo, ele na sua concepção firme. Era o nosso “mentirosinho”, meu e do Rudi, pois quando nos conhecemos ele nos mentiu que tinha 18 anos para podermos levá-lo na balada. Foi numa noite de 18 de dezembro, exatamente quando, ainda, completava 17 anos. Alto, quase um metro e noventa, físico de maior de idade, nunca foi barrado nas festas. Rapidamente trabalhou uns dias conosco na locadora e ficou, acho que quase dois anos trabalhando na Federação Espírita, participava das feiras de livros e ia, ou ligava, pra nós, religiosamente, toda semana. A visita semanal. Levava o meu sonho de doce de leite preferido ou os pãezinhos doces, únicos, que eram feitos na padaria ao lado da Federação e ficávamos tomando chimarrão e conversando lá na locadora até o anoitecer. Um garoto que , com 16 anos, sabia falar do protocolo de Kioto....Sempre lembrávamos desse episódio, no primeiro dia em que nos conhecemos. E muitas, muitas outras lembranças que , ainda, doem muito reviver. Na verdade, não há como esquecer. Hoje, por exemplo, mais uma vez acabei de assistir um filme com a Sandra Bullock. Que eu lembre, nunca tinha prestado muita atenção na atriz. Sim, eu sou muito dispersivo quanto a isso, ainda mais com artistas internacionais, enfim, não é o caso agora. Mas o fato é que ela era a atriz preferida do Diego. Tanto, que não tem como não associar um ao outro, sempre. Ficava horas falando dela, dos filmes, disso e daquilo.E eu só escutando. Fazendo uma coisa e outra e só escutando. Muitas vezes nem prestava muita atenção no que ele me dizia, pois eu estava trabalhando, atendendo clientes, o telefone e só lembro que ouvia Sandra Bullock pra lá, Sandra Bullock pra cá. E ele dava aquele sorrisão enorme e eu passava por ele e apertava o nariz e as bochechas dele, sentadinho ali no banquinho, perto da porta, apertado, do lado do armário, na divisa que separava a recepção e o bar, lá na locadora. Às vezes com a cuia do mate na mão, outras com o celular, mostrando fotos, músicas que havia baixado, as fotos dos sobrinhos gêmeos, que tanto amava e que seguiam acompanhadas das histórias de travessuras que os mesmos aprontavam sempre. Faz mais de um ano que o Diego não está mais aqui. Pra mim, não faz nem 30 dias. Não tive nem tempo de processar a informação do Juliano e em seguida já veio essa. É, esse é o nosso tempo... Da tecnologia, da rapidez da informação... Mas por vezes eu acho que não é a mesma rapidez com que um acontecimento pode atropelar o outro. E assim segue a humanidade. Atropelando-se. E assim seguimos nós, nessa teia confusa da vida, mergulhados nas nossas lembranças e recordações. Salve Sandra Bullock, por hoje. Salve, também, a possibilidade que eu terei de sempre enxergar nela uma pontinha daquele que era seu fã. Lembranças, lembranças tantas. Maio de 2010, um mês que ainda não terminou...

sábado, maio 01, 2010

O tempo corre. Está correndo agora.Lembranças, lembranças tantas...

            O ano era 2002. O mês, talvez, fevereiro. O início de noite, chuvosa. O tempo é que não pára, corre. Está correndo agora. Lembranças, lembranças tantas. Cheguei com o Francis, nessa noite comum, igual a tantas que não se tem nada pra fazer. Chegamos em péssima hora? Fui apresentado a ele, que choramingava uma relação recém acabada. Dentro de minutos de conversa já nos identificávamos, nos mesmos assuntos, nas mesmas desilusões, no contraponto de nossas opiniões.Na nossa capacidade de superação. Ríamos de nossas próprias desventuras, de nossas desgraças, comuns e em comum. Lá no apartamento do décimo andar, da Lima e Silva.Muitas e muitas e muitas situações e momentos passamos a viver ali. Primeiro,visitas freqüentes com o Francis, o Kadron, jantas, folias, conversas descontraídas até altas horas. Formamos um quarteto. Em maio, fomos à Anta Gorda.Fim de semana inesquecível.Recepção na família, inesquecível. Dormir e acordar com o “barulhinho” de uma água corrente, ao longe, inesquecível. O chimarrão da manhã e o almoço de domingo, inesquecível. A despedida e o “Grostoli” chorando pra vir junto no carro, com a gente, inesquecível. Cantávamos no mesmo coral, do Francis.Jantávamos quase todas as noites no “Chicken-in”, enfrente ao prédio.Prato feito, pedaços fumegantes de frango.Inesquecíveis. O cafezinho era lá em cima, depois. Outros tantos inícios de noite, depois do trabalho, passava na padaria da esquina e comprava dois doces. Ele fazia a janta, algo salgado, rápido, simples. Tinha refri e sempre o cafezinho que acompanhava nossas palestras até altas horas. Temas diversos. Amor, vida, morte, sorte, azar. Política, cultura, saudade, sexualidade, alegrias , desilusões. Numa dessas, citou aquela que nunca mais me abandonou: “A vida é feita mais de desencontros do que de encontros”. Constatação recíproca e efetiva no nosso dia-a-dia. Parceria presente nas nossas noites de baladas e de buscas triviais. Em outubro, fiz 30. Tem uma foto bem legal. Pizzaria, niver do Francis, da Sandi. Outros aniversários, outros momentos. O tempo corre, está correndo agora. Lembranças, lembranças tantas. Ele que me salvou, em 2003, emprestando uma sandália, velha, pra que eu a pintasse de prateado e pudesse ir a um baile, de carnaval, em Punta del Este.Loucura de carnaval, programa de índio internacional. Trouxe-lhe um cinzeiro, bem bonito de lá. Tem foto, também, do aniversário de 15 de abril de 2003, ali no Olaria. Os dias, os dias. Lá se foram mais outros tantos. Depois teve a época de aprender alemão.Todo o apartamento, inclusive as paredes,banheiro, tinham notas que identificavam as coisas em alemão. E tinha sempre uma coisa nova quando se chegava lá. No sofazinho sempre tinha um livro, revista ou cd diferente. Dava início ao assunto do momento. Ás vezes era um jogo de copos novos, que entre uma risada e outra ficávamos repetindo: “cuidado com o copo, é de cristal”, uma xícara diferente, uma mesinha nova de servir café, no centro da sala, com biscoitinhos, também diferentes. Uma vez ele ganhou umas taças de cristal mesmo, de uns amigos que tinham uma loja de antiguidades. Uma vez também fomos num leilão juntos, dessa mesma loja desses mesmos amigos. Foi muito divertido porque rimos muito, pois o motivo de termos ido justificava-se pelos salgadinhos que iriam ser servidos na ocasião. O tempo, o tempo. O tempo é que não pára, corre. Só nos deixa a sensação. E teve a vez na qual viajamos, junto com outro amigo, professor de filosofia também, até Pelotas. Ambos apresentariam um trabalho na faculdade de lá, numa noite de seminário acadêmico. Eu só fui de motorista. Faltando 20 minutos para o início da palestra deles, estávamos na entrada da cidade e não fazíamos a mínima idéia de onde se localizava a faculdade. Os dois estavam desolados e desesperados porque não iríamos chegar a tempo e começaram a falar ao mesmo tempo dentro do carro. Eu lembro que eu dei um basta e disse: “Calma, nós vamos conseguir chegar a tempo, calem a boca!”.Silêncio total. Eu só lembro que eu “voava com o carro” (após pedir informação a um policial) naquelas ruas desconhecidas daquela cidade onde eu nunca tinha estado antes. Foi tenso, doido, mas divertido, porque faltando exatos 2 minutos nós estávamos estacionando enfrente à universidade. Depois passamos a noite conversando até altas horas da madrugada, sem sono, num tipo de casa paroquial que eu havia conseguido, como pernoite, junto a uns amigos anglicanos. Fomos à casa do bispo, buscamos colchões e fomos muito bem recebidos por ele, que nos franqueou às chaves do local, mesmo tendo sido a primeira vez que estava nos conhecendo. Era uma quinta-feira e nosso programa noturno foi um lanche na praça central de Pelotas. No outro dia fomos ao Laranjal e visitamos o “Museu da Baronesa”. Chovia, estava um dia muito feio, mas a nossa amizade era muito mais do que esse detalhe. Comemos um pastel caseiro inesquecível e corremos, pulando na chuva, do carro até a água, pra marcar nossa presença naquele local e na nossa história. O tempo passa, o tempo corre. Está correndo agora. Eu tinha um amigo mestre. E me orgulhava, em outros círculos de amizade,quando na ocasião de um tema qualquer discutido, podia mencionar o nome do meu amigo e o seu exemplo de vida. Veio o doutorado, o sanduiche, a ida pra Alemanha. Eu tinha um amigo doutor. Orgulho de irmão, frescura de amigo. Exemplo a ser seguido, a ser comentado e apontado aos outros em diversas ocasiões. Ele mesmo e o Francis, certa vez, me convidaram para uma jantar, ali enfrente mesmo ao apartamento. Foi o jantar da “intimação”, digamos. Foi o momento em que demonstraram a preocupação deles comigo, com meu futuro e com minha formação. Disseram,exigiram e profetizaram:”Queremos te ver formado também!.”O tempo não pára, corre. Está correndo agora. Lembranças, lembranças tantas. Em 2009, uma semana antes de eu me formar estive no apartamento do décimo andar. Levava meu convite de colação de grau. Estavam lá um casal de amigos, alemães.Muito, muito simpáticos. Não falavam português. E o Juliano ficava traduzindo o tempo todo o que eles me diziam e o que eu falava.Ele iria levá-los ao Rio de Janeiro e ficariam uma semana por lá.Mas o convite estava feito. Em vinte de janeiro ele assumiria na faculdade federal, em Natal e esteve lá no meu serviço, em companhia de outro amigo, uma semana antes. Conversamos e rimos muito sobre muitas coisas, mais uma vez. Lá por outubro ou novembro de 2009 nos encontramos no MSN e conversamos longo tempo pela internet. Os mesmos dramas, as mesmas situações, as mesmas coisas da amizade de sempre. O tempo não pára,corre.Está correndo agora. Eu não sei o que foi feito de janeiro e fevereiro e março de 2010. Eu comecei o ano péssimo, em crises existenciais, profissionais, morais, que me afastaram de tudo e de todos. Fiquei fechado nas minhas próprias amarguras. Assim que, num anoitecer frio de um sábado de abril,do ano de 2010, numa esquina qualquer da cidade, recebi a noticia da maior das fatalidades. A notícia de uma “realidade para a qual não temos linguagem”. Algo que choca, fere, angustia, amargura. Algo que desbota a vida, a alegria, a felicidade. A brincadeira de mau gosto de um criador sarcástico? Uma de minhas conclusões para a maior estupidez da vida, entre tantas, que é a morte. Ou serei eu o estúpido ser pensante? Dúvidas e dúvidas e dúvidas que nos eram comuns em nossos dias de reflexões recíprocas. O tempo não pára, corre. Está correndo agora. Já anoiteceu. Dia 4 de maio fará 30 dias. Depois um ano, depois 5, depois 10. Mas nunca, que é um tempo muito distante,outros dizem que não existe, chegará o tempo em que se irá entender. Talvez aceitar?, talvez se conformar? Mas não entender. Lembranças, lembranças tantas.

Dedicatória de livro: ”Quando temos um porquê viver podemos, quase sempre, suportar um “como viver” (Nietzsche).E eu acredito que a poesia seja um desses porquês.”(30/06/2002).

Há certas coisas que falam por si mesmas. Aliás, há certas coisas para as quais as palavras são sempre insuficientes. A minha amizade por ti é uma delas e, não precisa ser dita, apenas vivida. E ela independe de tempo e distância.” (16/12/2002).

Preciso dizer que nossas recíprocas ainda são verdadeiras??. O tempo não pára, corre. E está correndo agora...