quarta-feira, novembro 04, 2009

Finados 1

Não sei se esse dia é para lembrar os mortos ou “aos vivos”. Como muitas coisas que já estavam aqui quando eu cheguei, ainda não parei para investigar- talvez no Google?- a origem desse feriado. Ou se o fiz, já nem me lembro mais. O que sei e o que vemos, é que cada vez mais o comércio se favorece dele. Não só flores, que são os alimentos para a alma nessa ocasião (não seriam as orações?), mas também balinhas e biscoitinhos estão presentes nos entornos dos cemitérios nesta data, pois os vivos também sentem fome. E, como todo lugar é lugar, principalmente nestes tempos difíceis de hoje, não há como deixar passar em branco (ou preto?), a oportunidade de aumentar a renda familiar oferecendo alguma quinquilharia de última hora. Sejam CDs ou DVDs do momento, jogos de vídeo-game, pilhas, fitinhas do Senhor do Bom Fim, antenas de TV ou veneno pra matar baratas; Os ambulantes, enquanto vivos, também precisam ter o seu dia, nem que seja o de faturamento. Até com a morte se faz negócio, se faz comércio, se quer faturar. Sabemos que ninguém se enterra por menos de mil reais. Não sendo indigente, carente ou algo que o valha e, não incluindo na fatura da funerária o livrinho de presença, o lencinho extra ou outra inutilidade incluída despretensiosamente, a conta, mesmo assim, não sai por menor valor. Depois tem a questão das coisas que se adquire após o “grande momento”, ou seja, os itens que irão fazer parte da decoração da morada eterna. Mármore, muito mármore. Horrores de mármores de todos os tipos. Placas de bronze em letreiros saudosos, e vasos, muitos vasos de todos os tipos e formas onde serão, finalmente, depositados, todos os anos, e depois de dois em dois anos, e depois só Deus sabe quando for possível ir, as já mencionadas flores, que foram vendidas ali em cima, no início do texto. E também muitos anjos, enormes, com asas gigantes, com a cabecinha pendendo para um lado, se possível o direito, num olhar cândido e benevolente, a velar por quem ali descansa, como um guardião fiel de uma alma que subiu aos céus e está sentada à direita de Deus Pai Todo Poderoso, que há de vir a julgar os vivos e os mortos. E assim, enquanto ele não vem, os mármores lá se vão. Os mármores, os “bronzes”, os “ouros” e tudo o mais que houver de valor e puder ser transformado em moeda, debaixo desse céu comercial em que vivemos. Não é de hoje que sabemos de violações de moradas eternas em busca de pertences que estejam junto de seus donos.


Nesta última terça(3/11), um amigo comentava comigo, desconsolado, depois de ter voltado do cemitério, sobre o roubo dos vasos de porcelana, belíssimos, que ele houvera colocado sobre o túmulo de seu pai, no ano passado. Lamentava, e com razão, não só financeira, mas do valor sentimental, de um objeto de decoração, ricamente organizado que embelezava o espaço do descanso eterno e tinha seus fins. Lamentava-se por demais naquela tarde tranqüila em que conversávamos. Depois que ele foi embora eu fiquei ainda remoendo os pensamentos sobre o assunto. Por quê tantos ornamentos, tanto mármore, tanto bronze, tanto ouro? Por quê, também, algumas pessoas se preocupam tanto em ostentar tamanho poder (financeiro?) com certos luxos para os olhos dos outros, vivos, num momento em que já nem existem mais? Que dizer também dos jazigos perpétuos de famílias, finamente decorados tal qual o palácio de buckingham?Assim que se estenderam minhas reflexões até ao questionamento inicial do significado do dia dois de novembro. Será que é para lembrarmos-nos dos que já se foram ou para não esquecermos de que nós, também,  um dia iremos? Tirando o evento comercial que é e o apelo religioso que sempre foi não sobra muito para o que eu considero de validade nesse dia. Na verdade, o que menos fiz foi lembrar algum parente morto, até porque lembro, de todos que amei, em vários momentos do ano, em sonhos, em aniversários destes, enfim, em várias ocasiões de reflexões e de lembranças saudosas que faço, vez por outra, quando me pego a procurar os “velhos tempos” ou os tempos que “passei e que não voltam mais”. Acredito que a melhor maneira de homenagear alguém que já se foi seja trazê-lo, sempre, em nossas recordações, vivo, na memória de nossa existência.

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